29.11.10

MACHO-DRAMA




Tem que colocar as prateleiras. Ele leva a furadeira. Mas cadê o nível, as buchas, parafusos? Não tem. Depois de algumas semanas passo na loja de material de construção. Com todos os materiais necessários, me sinto até apta a executar eu mesma a tarefa. Por que não? Não deve ser difícil furar uma parede com uma ferramenta elétrica que serve exatamente pra isso. Mas resisto. Quero que faça isso por mim.

Ele se coloca à frente da parede fazendo muitas caretas, a cada minuto perguntando “cadê o lápis, o nível?” Tudo aqui. Penso assim, ele tá nervoso, tá difícil, e me ofereço pra ajudar. Vai tudo bem até que eu faça a primeira cagada – deixar escapar o tal do nível quando ele está prestes a fazer a marcação de onde furar. Me sinto uma criança que fez caca, ele pragueja. Tento outro método pra acalmar o bicho e ofereço o que penso ser a mais infalível das ajudas, no caso dele: um drink? “Não”. A coisa é séria.

Já começo a perder as esperanças de uma atividade caseira conjunta bem-sucedida, o que pra mim queria dizer que, além de ter a prateleira no lugar, o processo seria uma coisa tranquila e até romântica, a cada furo eu lhe daria beijinhos e ele tomaria um gole do meu drink gelado.

Resolvo deixá-lo sozinho e vou fazer qualquer coisa na sala, mas de cinco em cinco minutos ele me chama. Continua praguejando entre os ruídos da furadeira e vez por outra berra palavrões. Eu só penso que chato, que chato, que chato. A atividade-caseira-romântica virou apenas um martírio necessário. Faço um drink e tomo sozinha. Penso que da próxima vez vou tentar fazer sozinha, assim me poupo desse drama por causa de uma prateleira.

Passo pelo quarto e o vejo fazer muita força com a chave de fenda. Ele ensina que conforme vai parafusando, a bucha vai se expandindo na parede e por isso é difícil. Me retiro outra vez, certo, não é tão simples como eu pensava, mas precisa praguejar?

Até que um grito de alívido vem do quarto: terminou! E finalmente ele está feliz e orgulhoso. Finalmente beijinhos e carinhos, ele me pede um drink. Ele explica, como quem se desculpa, que esse é o tipo de trabalho que se faz justamente para praguejar, para sofrer um pouco e xingar cada dificuldade. Só assim o orgulho de ter cumprido a missão é válido.

Faz muito sentido. Aprendo que se o seu amor pega a furadeira, esqueça o nhém-nhén-nhém. Isso é hora de ser macho, entendeu? Tome seu drink e seja feliz.

4.5.10

Azul

Não dá pra ser a vida toda você e eu no meu quarto azul assistindo filme no computador e tomando sorvete. A chuva caindo. Uma hora a gente tem que sair e as escolhas todas lá fora, os segredos para serem descobertos.

Li esses dias que amor eterno é amor impossível. Fiquei com vontade de te dizer que, olha que legal, a gente pode ter nosso amor pra sempre porque ele de fato não vai acontecer do jeito que “deve” acontecer. Quero dizer, o jeito que a gente tem medo porque acha chato, mas acaba querendo. Porque é amor.

Quando me dou conta estou com raiva do teu chope com os amigos e minha espera em vão, frustrada de ter imaginado as coisas gostosas que faria se você chegasse.

Me dá sensação de que a gente não é real. Só existimos nessa atmosfera de gozo e sorriso, cócegas no azul do meu céu. Eu sei que você também não quer sair. Vamos ficar aqui, vamos. Eu te amo.

29.3.10

cartas achadas



É amor isso, Billy? Que a gente vai fazer, o que vamos ser? A gente vai virar um casal bunda? Não pode. Tu tem que ser sempre assim. Eu pra sempre quero rir das tuas nóias. Mas se for amor, desses que a gente vê por aí, certo que vai chegar a hora de odiá-las. Meu medo é deixar tudo acontecer e chegar esse dia. Que o que é bom passa a ser ruim, que o que é engraçado passa a ser um saco. Esse dia, Billy, eu não admito pra nós.

3.2.10

necessidade, vontade

Tenho saudade de nóis dois. Tenho medo. E uma incrível vontade, que não cabe em mim e me dá mais medo. Do que estou perdendo e vou perder. De não ser tão feliz quanto acho que posso, quanto sinto dentro que há.

Vontade de ser intensa e olhar nos olhos, me dissipar nos liquidos, perder meu corpo de mim e voar na bruma de zuuuummm. Sou o amor o gozo a calma.

Preciso saber e esquecer, entregar pra o diabo que me carregue e deixe, que eu chore de tanto que entorna, entre as pernas e as bocas, entre as mãos e a bunda, nos cabelos e todos os pelos.

Estas noites de meus lençóis brancos sem mancha, revirados pelos meus sonhos e nada mais que os toque, a não ser esse sono inquieto. Uma caixa de memorias de risos e gozos no azul. Um zunido no ouvido – os resquícios dos gritos.

Por favor, vem.

13.1.10