10.7.08

danado




















Me assusta a crueldade do amor. Como somos punidos quando ele esbarra nas fatais impossibilidades, nos desencontros, nas contrariedades. Você me machucou porque me frustrou, não fez aquilo que eu esperava, então vou te punir com minha frieza. Vou te mostrar como é ruim não ter minha especial atenção, meu sorriso ao ouvir tua voz, meu olhar admirado. Vou falar com você como falo com minha mãe num dia em que estou mal-humorado. Vou falar com você muito mais interessado em continuar lendo um livro do que ter essa conversa. Mas não serei mal-educado, claro que não. Quero apenas que você sinta o quanto pode ser ruim eu não te amar, você não ser especial pra mim, ser como outra qualquer. Não. Ser claramente preterida a qualquer outra, seu pior pesadelo. Quero que você não apenas sinta que é comum, quero ainda que você sofra com isso e queira desesperadamente que eu seja denovo o cara que te olha como se tudo o que você faz fosse bonito e delicioso, divertido e encantador. Que você implore que eu volte a lhe beijar os pés, súdito. E minha voz lhe soe iluminada ao te ouvir. E que tudo seja envolto nessa atmosfera inventada, ideal, impossível. Onde não existem impossibilidades, não existe amargo, agonia. O que, convenhamos, não é amor.
Mas enfim tua agonia vai me redimir. Se vir tuas lágrimas, imediatamente me sentirei satisfeito, e logo arrependido. Tomado de culpa, vou me redimir e estaremos os dois enfim feridos e curados. Não há mais injustiça. Por algumas horas, com sorte dias, enquanto a reverência de um ou de outro for confortável, enquanto nem eu nem você representarmos ameaça a nós mesmos. Enquanto você me dominar apenas deixando que eu te domine, libidinosamente, puxando seus cabelos e te fazendo pedir tudo, sem parar, até o fim, com dor e desespero. Enquanto eu tiver o poder que você calcula e me dá. Até que eu perceba, num dia em que você estiver meio enjoada da minha cara de bobo, dos meus telefonemas ordinários pra contar mazelas do meu dia, que você está mesmo enfastiada. E vou pensar além, nos outros que você vai ver fazendo cara de bobo, pra variar. Nos telefonemas que você vai fazer pra ouvir outras mazelas. Não. Pra ouvir bobagens que nem te interessam, pra variar. E você vai dar e pedir pra algum idiota que vai beijar teus pés sem nenhuma autoridade.
Escutando aquela música que te mandei, ficará comovida e orgulhosa. Tua sincera admiração vai apagar todos os caracteres cruéis que havia produzido em noite de raiva e insônia maldizendo você. Travo a arma novamente, guardo minha angústia no HD. E vou ser o súdito que você ama. Um desgraçado feliz.